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A reforma tributária da transição sustentável
Foto: Freepik

A reforma tributária da transição sustentável

A Reforma Tributária aprovada em dezembro de 2023 é a primeira preocupada com a transição sustentável. Essa Reforma criada com a Emenda Constitucional n. 132 incluiu 307 mudanças no texto da Constituição da República. É uma reforma grande, relevante e, como veremos, alinhada com a agenda da transição sustentável. Sabemos que artigo 225 da Constituição […]

Carlos Strapazzon - quarta-feira, 21 de fevereiro de 2024 - 08:21

A Reforma Tributária aprovada em dezembro de 2023 é a primeira preocupada com a transição sustentável. Essa Reforma criada com a Emenda Constitucional n. 132 incluiu 307 mudanças no texto da Constituição da República. É uma reforma grande, relevante e, como veremos, alinhada com a agenda da transição sustentável.

Sabemos que artigo 225 da Constituição da República é um marco. Estabeleceu, em 1988, o direito constitucional de todos a um ambiente ecologicamente equilibrado e impôs o dever ao Poder Público e à coletividade de protegê-lo. O meio ambiente é equilibrado se biodiversidade e intervenção humana na natureza coexistirem de modo saudável. Esse direito constitucional protege esse objetivo da sociedade brasileira. Desrespeitá-lo é uma forma de afrontar-nos como sociedade e deve ter enérgica reação das instituições democráticas e republicanas. Com a Reforma Tributária de 2023, o Art. 225 foi alterado. Agora está escrito nele que para realizar esse direito o Brasil deve criar regras tributárias mais favoráveis para a produção e consumo de biocombustíveis e hidrogênio de baixa emissão de carbono. Essa mudança orientada pela agenda da mudança climática foi reforçada por outras que vou explicar.

Sabemos que a União Federal pode promover políticas de desenvolvimento regionalizado com tarifas especiais, seguros, preços de serviços públicos, juros favorecidos para o crédito bancário. A União também pode isentar determinadas atividades, reduzir alíquotas, prorrogar o pagamento de tributos federais. Pois a partir deste ano, todos os incentivos tributários da União para o desenvolvimento regional devem considerar critérios de sustentabilidade ambiental e redução das emissões de carbono.

Outro reforço a essa temática veio com a criação do Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional (FNDR). Esse fundo está na Constituição e será mantido pela União que destinará recursos a Estados e Distrito Federal para estudos, projetos e obras de infraestrutura; para fomentar atividades produtivas com potencial de geração de emprego e renda em setores estratégicos para o crescimento e inclusão social e para promover desenvolvimento científico, tecnológico e inovação. Contudo, a reforma estabeleceu que a partir de agora os Estados e o Distrito Federal devem usar os recursos desse Fundo priorizando projetos que incorporem ações de sustentabilidade ambiental e de redução das emissões de carbono.

Outra novidade é a possibilidade de a União tributar atividades prejudiciais a saúde e ao meio ambiente. A Reforma Tributária deu autoridade para a União Federal criar imposto com essa finalidade. Surpreende ler na Constituição que esse futuro imposto pode até incidir sobre o mesmo fato gerador e mesma base de cálculo de outros tributos já existentes.

A EC 132 também ampliou a possibilidade de os Estados utilizarem o IPVA para incentivar a produção de veículos motorizados com baixo impacto ambiental e desincentivar o oposto.

Importante também é a nova regra de partilha de receitas do novo IBS o Imposto sobre bens e serviços, de Estados, Distrito Federal e Municípios. É assim: do total do IBS distribuído aos Estados, 25% pertencem aos municípios. A distribuição desses 25% será feita com base em 4 critérios: (1) Igualdade: 5% vai em partes iguais para todos os municípios de cada Estado: (2) População: 80% vai segundo o tamanho da população dos municípios; (3) Educação básica: 10% vai ser partilhado de acordo com os avanços na qualidade e equidade da educação básica de cada município; Preservação ambiental: 5% vai ser partilhado de acordo com os indicadores de preservação ambiental de cada município. Ou, seja, os Municípios que mais se dedicarem ao desenvolvimento socioambiental (educação e preservação ambiental) receberão uma parcela maior dos recursos do novo IBS.

Tem outra regra idêntica a essa na parte que a Constituição trata da partilha dos recursos arrecadados pela União com o IPI sobre exportações. Outra fatia de 5% também será distribuída proporcionalmente aos municípios segundo os melhores indicadores de preservação ambiental.

Olhando agora para os temas de sustentabilidade socioeconômica, a Reforma Tributária de 2023 estabeleceu um novo objetivo para a política tributária do Brasil. A nova regra reconhece que o sistema tributário atual é injusto e determina a prioridade de alterações futuras diminuírem os efeitos regressivos do modelo atual. Um sistema tributário é regressivo se a carga tributária incide de maneira desproporcional sobre quem tem menor renda. É o caso do Brasil. A inovação é bem-vinda porque está perfeitamente alinhada com objetivo de reduzir desigualdades sociais e distribuir melhor o peso dos impostos para todos.

A Reforma Tributária também trouxe regras para reforçar o apoio ao cooperativismo e outras formas de associativismo e regras para estimular doações para instituições sem fins lucrativos com finalidade de relevância pública e social. Além disso, a União, Estados e municípios continuam tendo a obrigação constitucional de assegurar recursos mínimos para a política nacional de saúde, a partir de uma fração de suas receitas tributárias.

Ainda é cedo para dizer se o STF vai recepcionar todas essas inovações. Algumas delas são juridicamente polêmicas. Mas a inclusão de objetivos e regras que respondem às necessidades da transição sustentável são muito bem vindas.

A Constituição da República tem agora normas que encarecem atividades prejudiciais ao meio ambiente e à saúde, que reduzem o custo da produção de veículos menos poluentes, que incentivam investimentos que geram sustentabilidade ambiental e reduzem emissões de CO2. Também há diretrizes que aprimoram a proteção ao cooperativismo, que estimulam doações a entidades sem fins lucrativos com objetivos alinhados ao desenvolvimento socioambiental; também tem normas que premiam municípios com os melhores indicadores de desenvolvimento educacional e ambiental. Por fim, regras que determinam que as próximas alterações na legislação tributária devem priorizar a redução de tratamento injusto. Todas essas mudanças trazidas pela Reforma Tributária ficaram um tanto obscurecidas pela cobertura dada pela imprensa e redes sociais. Mas estão lá. Vieram para ficar e revelam importante alinhamento entre esta Reforma Tributária de 2023 e a agenda do desenvolvimento sustentável.

Carlos Luiz Strapazzon, Doutor
Professor em Programas de Pós-Graduação em Direito (Mestrado e Doutorado)
UNOESC e Universidade Positivo
Pesquisa a regulação da segurança social e do desenvolvimento sustentável

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