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Edital restritivo pode distanciar construção da Ponte de Guaratuba

Edital restritivo pode distanciar construção da Ponte de Guaratuba

Tribunal de Contas vê indícios de erros na licitação da Ponte de Guaratuba. Conselheiro Maurício Requião, questiona a retirada de poder do TCE pelo Tribunal de Justiça.

Pedro Ribeiro - sexta-feira, 10 de março de 2023 - 16:35

Tribunal de Contas vê indícios de erros na licitação da Ponte de Guaratuba. Conselheiro Maurício Requião, questiona a retirada de poder do TCE pelo Tribunal de Justiça que suspendeu liminar de cancelamento do edital.

A área de infraestrutura rodoviária do Governo do Estado pode levar o governador Ratinho Junior a arcar com um ônus político que o próprio não imagina. Embora os problemas que vem acontecendo na principal rodovia que leva os produtos do campo ao porto exportador – Paranaguá – a BR-277, sejam causados pela instabilidade do tempo, a ineficiência do poder público nas soluções é o espelho da insatisfação dos usuários, dos empresários do setor produtivo e de logística, com sérios prejuízos à economia paranaense.

Da traiçoeira BR-277, a gestão de Ratinho Junior também esbarra na Ponte de Guaratuba, onde o governador assinou contrato para execução do projeto e realização das obras. Há irregularidades na condução da licitação, questiona o pleno do Tribunal de Contas do Estado do Paraná. É possível que se volte à estaca zero por incompetência, também, dos atores da área de infraestrutura rodoviária.

O conselheiro Mauricio Requião, do Tribunal de Contas do Paraná (TCE-PR), deu 15 dias, a partir desta segunda-feira, 6, para que o Departamento de Estradas de Rodagem (DER) apresente a íntegra do Estudo de Viabilidade Técnica, Econômica e Ambiental sobre a ponte de Guaratuba, uma vez que a documentação estaria incompleta.

Requião pediu ainda a íntegra do Estudo de Impacto Ambiental e do Relatório de Impacto, o Relatório de Engenharia a respeito do tráfego viário na ponte e o inteiro teor do protocolo de intenções firmado entre o Governo do Estado do Paraná e o Ministério Público do Estado do Paraná a respeito da circulação de caminhões sobre a ponte. A determinação está publicada no Diário Eletrônico do TCE na última terça-feira (7).

Se o Tribunal de Constas do Estado do Paraná – TCE – tem poder de fiscalização dos atos dos gestores públicos, conforme determina a Constituição Federal de 1988, “por que lhe tiram, ao mesmo tempo, esse poder, como ficou claro na decisão do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná (TJEP) que o impede de suspender um contrato de obra pública já assinado pelo Governo do Estado e que merece análise mais profunda do ponto de vista das exigências licitatórias?”.

 O questionamento é do conselheiro do Tribunal de Contas, Maurício Requião, referindo-se à homologações de cautelares do Pleno do Tribunal de Contas, cancelando a licitação da Ponte de Guaratuba, depois de analisar representação feita pela empresa Construtora Gaspar, uma das participantes da licitação, alegando que a limitação da comprovação de experiência em um único atestado é um vício. O TCE recebeu a representação e deferiu liminar determinando a suspensão imediata do processo licitatório.

 Poucos dias depois, a presidência do Tribunal de Justiça do Paraná concedeu a liminar suspendendo os efeitos da decisão do Tribunal de Contas. Entre as alegações, considerou a impossibilidade de sustação do contrato pelo TCE a quem caberia tão somente recomendar a sustação pelo Poder Legislativo, que solicitaria medidas cabíveis ao Poder Executivo. Também alegou que, se persistir o ato coator, haverá atraso no cronograma global de execução das obras da ponte.

 Requião disse que, dentro do seu papel, do Tribunal de Contas recorreu do recurso junto ao Tribunal de Justiça, cuja decisão está nas mãos do relator e aguarda parecer. “Mergulhei no mundo da engenharia para estudar e me instruir no caso, do ponto de vista técnico, visando a atender ao papel dos tribunais de contas quando se trata de edital restritivo ou ilegal”, disse o conselheiro.

 O Governo do Estado assinou contrato com a empresa OEC, do Grupo Odebrecht, que tem problemas com documentação, onde apresentou um projeto terceirizado de uma obra realizada na Venezuela e, portanto, também deveria ser inabilitada, como reclama a Gaspar.

 Para entender o caso:

 A licitação do DER tem como objeto a contratação de empresa para elaboração do projeto básico e executivo e execução das obras de implantação da Ponte de Guaratuba e seus acessos.

 A norma editalícia exige, portanto, que a licitante demonstre experiência técnico-operacional, com o cumprimento de 05 quesitos quantitativos e qualitativos num só atestado de obra. Quais sejam:

 a. Ponte com extensão de 600m;

 b. Área de tabuleiro de 14.057m2;

 c. Trecho estaiado;

 d. Método construtivo sem escoramento (balanços

sucessivos);

 e. Vão livre compatível (160m);

 A exigência de cumprimento desses cinco quesitos de experiência, de cunho quantitativo e qualitativo, num só atestado, foi objeto de impugnação (peça 09), mas o DER decidiu por mantê-la (peça 10).

Em análise inicial da questão, que é complexa e envolve diversos aspectos técnicos, aponta-se que a cumulação imotivada de cinco capacidades técnico-operacionais, de cunho quantitativo e qualitativo, muito provavelmente restringiu o caráter competitivo do certame. 

O que ocorreu, na prática, foi a exigência de que as licitantes comprovassem experiência na elaboração de projeto e execução de uma obra cujas características, tal como descritas no item 15 do Anexo I do Edital, correspondendo a pouquíssimas pontes construídas no Brasil, o que, em decorrência, reduz muitíssimo o número de empresas que poderiam comprovar tal experiência.

 A Gaspar relata que participou do procedimento licitatório por intermédio de um consórcio – Consórcio Guaratuba – o qual ficou classificado em 1º lugar na fase de lances, pela oferta do valor de R$ 386.799.000,11, mas que foi inabilitada especialmente diante da não comprovação de experiência dos serviços por meio de 1 (um) único atestado, qual seja:

 01 (uma) Obra de Arte Especial, de no mínimo 600 metros de extensão, com trecho estaiado, e área de tabuleiro mínima de 14.057 m², conforme quantitativos da tabela 1 – Capacidade Operacional. A ponte deve ter sido construída com método de concretagem in loco tipo balanço sucessivo, ou outro método viável para construção de  pontes similares ao objeto da licitação. A obra deve ter vão livre compatível com a obra do objeto.

Sobre esta exigência, antes da apresentação das propostas, o DER/PR emitiu um documento denominado “Parecer Técnico com Justificativa para os requisitos de qualificação das licitantes”, afirmando que “A experiência em ponte estaiada pode ser substituída por experiência em outros métodos executivos, a exemplo de ponte pênsil, porém não serão aceitos acervos de pontes convencionais em viga apoiada” entretanto, quando da habilitação das licitantes, desconsiderou seus próprios esclarecimentos e inabilitou a 1ª e a 2ª colocadas em relação ao atendimento deste requisito, visto que estas comprovaram a experiência em conformidade com o referido Parecer, ou seja, através de método construtivo denominado balanço sucessivo, mais complexo que o de pontes convencionais apoiada sobre vigas. Em relação aos recursos administrativos que faziam referência ao Parecer, o DER apenas os julgou improcedentes, sob o argumento de que a complexidade da ponte demandaria comprovação de execução de obra com a integralidade das características previstas no instrumento convocatório. 

Em seu recurso, a Gaspar explica ainda que sua inabilitação decorreu também da não apresentação de: a) Profissional Engenheiro Geotécnico ou Geólogo com experiência comprovada em investigação geotécnica em ambiente marinho, através de Atestado/Certidão acompanhados das respectivas Certidões de Acervo Técnico – CAT, porém entende que tal forma de comprovação não era exigida no edital e que sua apresentação extemporânea seria justificável com base no artigo 64 da Lei 14.133, e b) Profissional com Atestado/certidão de Responsável Técnico de elaboração ou Execução de Plano Básico Ambiental – PBA, em obra similar ao do objeto licitado, entendendo entretanto que o órgão licitante consignou que os atestados não guardam similaridade com a experiência profissional necessária para a contratação.

 A Gaspar alegou ainda que apresentou a proposta mais vantajosa, e que só poderia ter sido preterida na hipótese de não atendimento ao ato convocatório, acrescentando que o contrato foi assinado em 05.12.2022, e que os atos para ultimação do certame foram praticados com enorme e incomum agilidade, em meio a datas com suspensão/limitação de expediente. Seguiu a mesma eficiência e agilidade com que foram praticados os atos para justificar a habilitação da 3ª colocada.

 Além do processo administrativo junto ao Tribunal de Contas, os demais pedidos judiciais, apresentados pelas partes interessadas requeriam, liminarmente, a suspensão do Contrato assinado com a 3ª colocada, porém, as decisões dos Desembargadores do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, negam a necessidade de suspensão para análise mais detalhada da documentação de habilitação das concorrentes, sob o argumento de que tal procedimento poderia ocasionar maior onerosidade para a administração pública, apesar das propostas da 1ª e 2ª colocada terem sido em valor inferior, além de retirar a legitimidade da decisão do Pleno do Tribunal de Contas de homologar a suspenção da licitação determinada por seu conselheiro Maurício Requião.

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