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Passados 91 anos e o voto continua masculino!

Passados 91 anos e o voto continua masculino!

O voto feminino foi incorporado à Constituição de 34. Tornou-se obrigatório em 1965. E mesmo assim a desigualdade de gênero ainda é uma triste realidade

Daiana Allessi - quinta-feira, 23 de fevereiro de 2023 - 11:20

Em 24 de fevereiro de 1932, há 91 anos, um novo Código Eleitoral entrava em vigor, (Decreto 21.076) dando às mulheres o direito ao voto. Essa data passou a ser formalmente comemorada a partir de 2015, com a promulgação da Lei nº 13.086, que instituiu o Dia da Conquista do Voto Feminino.

E sempre que eu penso em voto, em direitos e em escolhas, não consigo me apartar da ideia de cidadania incompleta das mulheres.

Foram tantas arbitrariedades, proibições, descalabros e insanidades, não só do ponto de vista da permeabilidade política, mas em todas as esferas da vida, que penso que de fato estaremos integradas à sociedade quando não precisarmos mais de datas comemorativas para lembrar nossas suadas conquistas.

De todo modo, saber que há 91 anos nos foi “propiciada” a participação política através do voto, inicialmente de forma precária e facultativa, somente se tornando obrigatório, ou seja, equiparado ao dos homens, em 1965, me causa questionamentos.

  • Quanto mais precisaremos avançar?
  • Quantas barreiras, misoginia, chacotas e entraves as precursoras do sufrágio feminino tiveram que aguentar?

Tantas mulheres brasileiras, vanguardistas e historicamente protagonistas abriram os caminhos para que hoje a igualdade entre homens e mulheres seja prevista constitucionalmente. 

E o que mudou nesses 91 anos? Temos uma representatividade política pequena, que aumenta muito vagarosamente, e constantemente somos engolidas pelas pautas patriarcais hegemônicas, ou pelas representantes mulheres que não estão comprometidas com uma agenda de alargamento dos direitos femininos.

A diversidade, a pluralidade, o feminismo (este entendido como equidade entre homens e mulheres) enquanto necessidades atuais para uma sociedade mais sustentável e justa, são cada vez mais apunhaladas pelos desmontes de políticas públicas, pelo neoliberalismo e pela crescente onda de recrudescimento social.

Os sinais são claros de que precisamos de uma revolução cultural, de um movimento que naturalize o feminino ao lado do masculino, sem hierarquias, heresias ou ranços.

E mesmo sendo maioria da população e do eleitorado brasileiro, seguimos sendo sub-representadas na política institucional. De acordo com dados colhidos nas eleições realizadas em 2022, na Câmara dos Deputados, somos apenas 17% dos parlamentares; no Senado Federal 18%.

As eleições municipais de 2024 se avizinham e será que teremos mudanças? Espero que sim, que tenhamos mais incentivos, tanto do ponto de vista pessoal como financeiro e social para adentrar nas esferas de decisão e disseminar diversidade e perspectivas femininas.

Que essa reflexão sirva para orientar as mulheres que ocupam a política atual, mas, sobretudo, sirva como um tributo de gratidão às precursoras, mulheres potentes que agiram muito à frente do seu tempo, da sociedade em que estavam inseridas e produziram inúmeras fissuras neste Brasil tão masculino e hierarquizado.

Gratidão, Nísia, Bertha, Julia, Celina, Mietta, Leolinda, Carlota, Alzira, Terezinha e tantas outras potências no campo político. 

Oxalá que a força de todas essas mulheres, citadas e não citadas (pois foram muitas) possa fortalecer e inspirar nossas mulheres a ocuparem seu espaço na política, representando além de mera presença física, ideias e agendas que efetivem os direitos femininos ocultados pelas sombras do machismo.

“O lar é a base da sociedade e a mulher estará sempre integrada ao lar. Mas o lar não se limita ao espaço de quatro paredes. O lar é também a escola, a fábrica, o escritório. O lar é principalmente o parlamento, onde as leis que regulam a família e a sociedade humana são elaboradas.”
(BERTHA LUTZ)


Daiana Allessi é mãe, esposa, advogada, professora e pesquisadora sobre gênero e direitos das mulheres.

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